Representações de 142 países - sendo 90 delegações oficiais - lá compareceram, nas palavras e propostas dos 35.500 participantes. É de se lamentar que o Brasil, secularmente de costas para a América Latina, não tenha marcado presença significativa.
Em Cochabamba, alguns consensos foram firmados. O primeiro deles deriva da cosmovisão dos povos andinos, cada vez mais empoderados, que ensina ao Ocidente colonialista que não estamos sobre a Terra para dominá-la, mas somos parte dela, para desfrutá-la em harmonia. A natureza não é uma mercadoria, com seus "recursos", mas nosso ambiente vital: superorganismo vivo (Gaia) que se autorregula, da qual somos partícula pensante e amorosa - mas também com potencial violento e destruidor.
Outra compreensão comum foi o caráter predador do estímulo ao consumo insaciável em um universo finito. O sistema capitalista tem no êmulo do lucro, da competição e da superexploração da natureza uma perversidade congênita. A clara condenação das estruturas do capital não obscureceu o senso crítico: reconheceu-se que o chamado "socialismo real", produtivista, do planejamento centralizado, foi, por outro lado, igualmente letal para nossa casa comum, a Terra. Hoje, não por acaso, EUA e China são os maiores poluidores do planeta.
Cochabamba definiu posições: indicou para 22 de abril de 2011, Dia da Terra, um referendo mundial sobre o sistema produtivo hegemônico, sobre a redução da emissão de gases e sobre a transferência dos recursos bélicos para medidas de mitigação dos danos ambientais.
Será criado um Tribunal Internacional de Justiça Climática e Ambiental.
A dívida climática será cobrada daquelas nações que geram contaminação e superaquecimento, incidindo em percentual sobre seu PIB. Cochabamba aprovou, por fim, a Declaração Universal dos Direitos da Mãe Terra, a ser conhecida e respeitada por povos e governos do planeta inteiro.
Da Bolívia, no coração da América do Sul, ouviu-se um grito humaníssimo pela Mãe Terra, a Pacha Mama: se não mudarmos o sistema, o clima continuará mudando e tornará inabitável o planeta. Urge uma revolução cultural para fazermos, no cotidiano, do necessário o suficiente. Praticando o "bem viver", que é a vida em plenitude, na dignidade do ser e não na acumulação e desperdício do ter.
Chico Alencar é professor e deputado federal (PSol-RJ)
[Publicado em O Globo, 01/05/2010O acordo dos povos: http://transnet.ning.com/profiles/blog/show?id=2018942%3ABlogPost%3A44176&xgs=1&xg_source=msg_share_post
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